Ombudsman: o case de Vera Giangrande e o Pão de Açúcar

Supermercado Pão de Açúcar: carro-chefe do grupo
A relações públicas Vera Giangrande (1931 – 2000) protagonizou, em sua passagem pelo grupo Pão de Açúcar, um dos cases mais pertinentes relativos à implantação do cargo de ombudsman interno e externo já visto no Brasil. 


Hipólito Gouveia

Na ocasião, o grupo Pão de Açúcar, em plena fase de reestruturação, possuía quatro marcas: o Extra, o SuperBox, o Eletro, e, finalmente, o Pão de Açúcar – carro-chefe da corporação.

Uma das primeiras medidas adotadas na gestão interna dos talentos da organização foi a criação de um videojornal mensal. Aqui, as notícias, que convencionalmente são expostas em periódicos institucionais impressos, foram para a tela de um monitor, atraindo a atenção dos colaboradores, muitos dos quais não adeptos do hábito da leitura. Por meio do videojornal, informações da organização e quadros motivacionais eram exibidos.

Como nas relações públicas ouvir é fundamental, um questionário era distribuído entre os telespectadores para colher dados e opiniões. Foram as reivindicações presentes nos formulários que levaram o Pão de Açúcar a criar o cargo de ombudsman interno, voltado para os problemas e queixas dos colaboradores. Todos nós gostamos de ser ouvidos. Óbvio que os colaboradores também. O gestor deve manter uma boa comunicação com os funcionários da organização. Deve-se falar honestamente e escutar com atenção os membros da equipe.

Atendimento

O ombudsman interno tem a função de atender os solicitantes sem burocracia e com firmeza e eficiência. O termo equivalente para ombudsman, em português, é ouvidor. Caso as solicitações não sejam respondidas, ou o profissional da ouvidoria não demonstre segurança, a credibilidade do cargo é posta em cheque. No grupo supermercadista, todavia, o case foi bem sucedido, conseguindo, o ombudsman interno, aglutinar e adquirir credibilidade junto aos colaboradores. Estes, por sua vez, não eram obrigados a se identificar no ato da queixa ao ouvidor. E, mesmo os que se identificavam, tinham os seus nomes mantidos em sigilo.

Com o passar do tempo, as ocorrências registradas pelo ombudsman mostraram-se complexas e interessantes. Vera Giangrande conta em seu livro (escrito em co-autoria com José Carlos Figueiredo), O cliente tem mais do que razão: a importância do ombudsman para a eficácia empresarial, que, na ocasião das enchentes no Rio e em São Paulo, alguns funcionários da rede de supermercados sofreram perdas significativas. Desolados com o prejuízo e, obviamente, sem condições de concentrarem-se no trabalho, os colaboradores foram atendidos pelo ombudsman, o qual, junto à assistente social da organização, providenciou pertences básicos como roupas e mobílias principais, possibilitando o retorno do colaborador ao cotidiano e ao trabalho efetivo.

Campanhas internas

Campanhas internas também foram realizadas. Sob o lema de que primeiro é necessário vender o produto para o público interno para, somente depois, contemplar o público externo com o lançamento, o grupo promoveu ações internas para apresentar o lançamento da linha de produtos com a marca Pão de Açúcar, por meio de vídeos, folhetos e catálogos.

Em outra campanha – que lançaria para os clientes a possibilidade de comprar utilizando cheque pré-datado com juros diferenciados – além dos tradicionais treinamentos ofertados aos funcionários, foram distribuídos cartões com uma espécie de “cola”, para sanar dúvidas que eventualmente pudessem surgir no ato do atendimento ao consumidor.

Visitas e eventos

Vera Giangrande
O ombudsman também visitava as lojas, colhendo percepções e conversando com colaboradores escolhidos de forma aleatória. Assim, com diálogos aparentemente simples, o profissional identificava o clima organizacional e os líderes informais da equipe. Mas a visita não se restringia a boas doses de conversas. Vistorias também identificavam falhas estruturais no ambiente dedicado aos colaboradores, possibilitando a solicitação e a efetivação de reformas. Os banheiros, os vestuários e as áreas de refeições foram algumas das áreas contempladas com melhorias.

Eventos envolvendo os familiares dos funcionários e os próprios colaboradores também foram realizados. Destaque para um concurso de cozinha experimental, o qual premiou as melhores receitas inscritas pelos participantes do concurso, destinado às esposas dos trabalhadores e às funcionárias da organização. Ainda mais cativante, o concurso de desenhos envolvendo os filhos dos colaboradores premiou os melhores desenhos e os aproveitou nas estampas dos cartões natalinos do grupo.

Uma organização é uma estrutura viva, e o que a faz viva, seguramente, não são as máquinas e as prateleiras. São os recursos humanos que a tornam um empreendimento de sucesso ou um retumbante fracasso. O caminho – da vitória ou da derrota – dependerá do gerenciamento dos talentos da casa. Diante de organismos doentes, vícios maléficos devem ser expurgados. Um gestor deve eliminar a indiferença e o destrato na relação com os seus colaboradores.
 
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