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Para além de depósitos e maquinários, gigantes do mercado
tem em seus personagens registrados seus maiores patrimônios. De filmes e gibis
a licenciamentos, Mickey Mouse e outros funcionam como verdadeiros mentores na
introdução de jovens e crianças no mundo do consumo.
Eloy Zaidan*
Quando pensamos em produto, imaginamos artigos tangíveis. Entretanto,
há diversas modalidades de produtos que não são necessariamente palpáveis. O
brasileiro Maurício de Souza e norte-americano Walt Disney ergueram impérios
com personagens fictícios infantis como produto. Tratam-se de propriedades
intelectuais bastante rentáveis. Um personagem infantil pode ser vendido e
consumido de diversas formas, o que inclui o licenciamento para outras
empresas.
Para se tornar bem-sucedido, um personagem infantil deve ter
a faculdade de se comunicar com as crianças. Para tal, também aqui, é preciso entender
as fases da criança com vistas a criar um personagem (e fazer sucesso)
compatível com o segmento de idade que se deseja abordar. Montigneaux aponta
algumas dicas referentes aos recursos de comunicação, inerentes aos personagens,
para se obter a adesão do público infantil.
- Até a puberdade: a criança pensa que as coisas a sua volta
são dotadas de vida. Nesta fase, para atingir uma proximidade com a criança,
são de boa valia as mascotes de aparência humana ou animais com antropomorfismo
marcante.
- Até os seis anos: a mão do personagem deve ter quatro
dedos.
- De três a seis anos: os personagens devem ter formas arredondadas
(aspecto de bebê). As ilustrações não precisam ser muito complexas. Na
realidade, o aspecto gráfico da criatura deve ter um número de cores limitadas
e, na maior parte, chapadas.
- A partir dos seis anos: “estar na moda” faz o personagem
valorizar-se perante o seu público. Aqui, a influência do grupo de amigos é
definitiva.
- Dos oito a 12 anos: há uma nítida preferência por
personagens hábeis, ágeis e graciosos. Os tipos mais brutos acabam ficando em
segundo plano.
Para se comunicar com uma criança a partir dos nove anos o
personagem deve estar em sintonia com a necessidade de transgressão de seu
target. Aspectos de docilidade e civilidade são descartáveis nesse momento. O
personagem deve ser, simultaneamente, criança (para que a criança se reconheça),
e adulto (para que ela se projete). Para tal, recomenda-se que as mascotes
devam ser um pouco mais velhas que as crianças a quem elas se destinam.
A criança sabe muito bem o que está na moda. Sua percepção é
acentuada, sobretudo com a convivência entre amigos. O personagem deve ter
alguma notoriedade para obter a adesão da criança. Os bonecos do canal por
assinatura Cartoon Network tornaram-se uma mina em vendas de produtos
licenciados. O sucesso de tais mascotes se deve, principalmente, a profusão da
exposição durante a programação da emissora.
E quanto ao uso de animais para composição de personagens,
como feito em demasia pelos estúdios Disney? Animais sensibilizam os mais
jovens. Porém, se a opção for mesmo a da utilização de animais, estes devem
possuir altas doses de antropomorfismo, ou seja, traços e características
humanas. O clássico Mickey Mouse, por exemplo, possui trejeitos de um humano
astuto, embora seja um camundongo. Margarida – namorada de Donald – pouco se
assemelha a uma pata em suas atitudes. O antropomorfismo pede traços físicos humanos
expressivos: rosto, olhar, gestos, piscada de olho, postura geral do corpo e
posição das mãos.
Algumas características tornam um personagem mais atraente
para as crianças. A mascote deve ser engraçada e simpática, lúdica, deve
acompanhar fielmente a criança, e precisa ser dotada de uma dimensão mágica
para a fuga do cotidiano (através de dotes físicos ou intelectuais).
No caso de um herói, seu comportamento deve ser previsível e
imutável. A sua maneira de ser e de se comportar deve ser repetitiva. A
repetição ajuda a tranquilizar a criança. Para constatar como a repetição é uma
artimanha comunicativa válida, observe o roteiro singelo dos seriados de grupos
de heróis, como Power Ranger, que embora não seja um desenho animado, tem como
público-alvo os jovens consumidores de personagens animados.
O bandido é parte fundamental na construção do herói. Quanto
mais cínico e cruel o bandido, mais o herói parece justo. O super-herói, aliás,
para a criança, precisa possuir poderes mágicos e, ainda assim, fraquezas (por
vezes medo, atitudes desastradas), que lhe concede humanidade, tornando-o
simpático. Contudo, com ou sem fraqueza, o fato é que, em se tratando de tal
modalidade de mascote, o personagem deve ser dono de um bom caráter inquestionável.
O segredo do sucesso dos super-heróis está no potencial tranquilizador de sua
bondade poderosa. Este é o tranquilizante que serve à criança em meio a
estruturas familiares cada vez mais movediças.
Muitos super-heróis costumam evocar um processo para se
converterem de pessoa normal a justiceiro (Clark Kent entra em uma cabine
telefônica e sai transformado em Super-Homem). O processo de transformação do
personagem homem em super-herói evoca, para a criança, a sua passagem à idade
adulta.
Um contato travado entre a marca e o indivíduo, ainda na sua
infância, será um passo fundamental para obter a sua fidelidade e torná-lo um
cliente quando crescer. Como agravante, há ainda o fato de que não é de hoje
que as crianças influenciam o consumo de seus pais. Tal influência, diga-se,
não se restringe aos produtos diretamente voltado para os pequenos. A
precocidade do consumo dos jovens acarreta na inserção destes na participação
das compras domésticas, pelo menos por meio de sugestões e pedidos. E birras.
*Eloy Zaidan é jornalista e professor da Unidade
Acadêmica de Gestão e Negócios do Instituto Federal da Paraíba – campus João
Pessoa.
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