O case paraibano de uma empresa familiar de coleta seletiva, a P & P reciclagem, que promove a logística reversa ao passo em que gera empregos, contribui com o meio ambiente e gera divisas para a economia do estado.
Tiago Eloy Zaidan*
Véspera do dia das mães. Os shoppings estão cheios e as
lojas comemoram o crescimento nas vendas. O aumento do consumo anima a economia
e favorece a manutenção ou geração de empregos e incrementa a arrecadação de
impostos. No dia seguinte à comemoração, todavia, as latas de lixo estão
abarrotadas de resíduos sólidos, oriundos da farra do consumo de horas atrás.
São caixas de papelão, sacos plásticos, garrafas de vidro, peças de alumínio e
toda sorte de descarte, os quais em geral vão acabar sobrecarregando o aterro
sanitário da cidade. Muitas vezes, movidos no modo piloto automático, os
consumidores não se apercebem que as embalagens que agora jazem no lixo possuem
um custo para serem produzidas. E que esse custo estava inserido no preço final
da mercadoria pelo qual pagaram.
E se houvesse uma forma de reverter este processo; de fazer
com que todo esse descarte fizesse o caminho inverso? Ou seja, que as
embalagens as quais se encontram no limbo da lata de lixo fossem levadas de
volta para a indústria, para dar origem a novos produtos. Ao reciclar as
embalagens já existentes, a indústria pouparia recursos naturais para produzir
novos produtos. Por outro lado, menos resíduos seriam descartados no meio
ambiente. E, não menos importante: para viabilizar todo este processo de
logística reversa, novos empregos teriam que ser criados.
Tudo isso é possível. Este é o mundo das empresas que atuam
no setor da coleta seletiva e da logística reversa.
É o caso do empreendimento paraibano P & P, o qual capta
os resíduos sólidos gerados pelas empresas parceiras e busca fazer a logística
reversa desses materiais descartados. Ou seja, dirige esforços para fazer com
que esses resíduos sejam reciclados e voltem ao mercado.
“A gente sempre tenta reciclar ao máximo, porque isso é uma
receita para a empresa e automaticamente está ajudando o planeta. E se a gente
não tem uma destinação final para aquele item, tentamos trabalhar. A gente pega
aquele produto e leva para um laboratório, para fazer uma análise, para saber
que produto é aquele”, explica Emmanuel Barbosa de Lima, 36 anos, gerente
operacional da P & P.
As empresas parceiras, cedentes dos resíduos, auditam
regularmente a instituição coletora, para se certificar da correta destinação
dos descartes. A P & P, por sua vez, destina os recicláveis para parceiros
na indústria, devidamente licenciados, aptos a reciclarem o descarte.
Família e reciclagem
A P & P é uma empresa familiar. Foi criada em 2006 por
Israel Ferreira de Lima, 67 anos. As primeiras incursões de Israel pelo setor
da reciclagem, no entanto, ocorreram bem antes. Nos anos 1980, o empreendedor
trabalhava no setor administrativo de uma fábrica de caixas de papelão no
Conde, município vizinho à capital João Pessoa. Nessa época, Israel vislumbrou
a possibilidade de fornecer matéria-prima para a fábrica onde trabalhava.
Assim, em 1987, criou uma pequena sucataria, com o objetivo de coletar papeis
em geral para fins de reciclagem. Em 1994, Israel se desligou da indústria de
papelão para se dedicar integralmente a sua firma de reciclagem.
Os anos que se seguiram, de 1994 até 2002, foram dramáticos.
A recessão e a retração do consumo verificada no país nesse período impactaram
fortemente os negócios de Israel. Em meados da década de 2000 a situação voltou
a se estabilizar, e tornou-se mais promissora depois que o empreendedor
expandiu o seu portfólio para plásticos – até então, a sua atuação se
restringia a reciclagem de papéis. Nasceu então a P & P. A partir daí a
empresa de reciclagem ampliou ainda mais o seu portfólio e hoje trabalha também
com ferro e madeira, dentre outros itens. A ampliação da gama de materiais
coletados foi inevitável, em função das exigências do mercado. As empresas
cedentes de resíduos sólidos buscam parceiros que deem conta da maior
quantidade possível de itens.
Emmanuel frisa, entretanto, que antes de fechar contrato com
uma empresa geradora de resíduos, a P & P precisa se certificar de que na
outra ponta haverá um parceiro para receber e reciclar o respectivo descarte.
Caso contrário, há o risco de a empresa coletora ficar com o material retido em
seus galpões.
Operação
A P & P está sediada no município de Santa Rita, região
metropolitana de João Pessoa. Sua gestão já está na segunda geração da família.
O contador Emmanuel Barbosa de Lima, o qual ocupa a função de gerente
operacional, é filho de Israel. A empresa conta, atualmente, com 47
funcionários. Em seus quadros, consta uma equipe de divulgadores, os quais se
encarregam de visitar as empresas apresentando o serviço de captação de
resíduos sólidos recicláveis. No entanto, Emmanuel garante que a vedete do
marketing da organização é o boca a boca. Os gestores das empresas, em suas
interações, mencionam o trabalho realizado pela P & P e assim acabam por
contribuir com a amplificação do alcance da marca.
Além de indústrias – dentre as quais consta, até mesmo, uma
fábrica de automóveis –, a P & P firma parcerias para coleta de resíduos
com empresas do setor de serviços, como redes de supermercados. Os parceiros na
indústria, cedentes de resíduos sólidos, podem estar na Paraíba ou em outros
estados no nordeste, como Bahia, Pernambuco e Ceará. Nestes casos, a P & P
vale-se de uma frota terceirizada para recolher os resíduos e empreender a
logística reversa.
Quando convidada, a empresa de reciclagem também atende a
eventos. Muitos promotores têm buscado alternativas e firmado parcerias com
vistas a reduzir a pegada ambiental dos eventos os quais organizam. Nesse
contexto, a P & P é envolvida para realizar o gerenciamento dos resíduos
sólidos gerados durante congressos, feiras etc.
Já o mapa de destinação dos resíduos sólidos pela P & P
é mais amplo. O gerente operacional da organização explica que os parceiros
receptores são sondados por meio de pesquisas e em eventos do setor. Cada
indústria recicla um determinado tipo de resíduo. A P & P vai em busca de
cada uma delas, em qualquer lugar do Brasil, tais como Santa Catarina e São
Paulo, e negocia a entrega dos resíduos para serem reciclados. O envio da carga
também é feito por meio de frota terceirizada.
A remuneração pelo serviço de captação dos resíduos sólidos
recicláveis é variável, e depende do contrato. Pode haver casos em que o volume
de resíduos recicláveis gerados pela empresa parceira seja tão grande que o
valor do próprio material reciclado coletado já cobre as despesas. Na maioria
das vezes, todavia, as empresas parceiras precisam pagar um complemento, o qual
se soma ao valor dos resíduos sólidos coletados, com vistas a cobrir as
despesas do procedimento de logística reversa realizado pela P & P. Isso
porque o volume de resíduos sólidos recicláveis gerados pelas empresas
dificilmente é estável. Varia muito de mês para mês, a depender do quão
aquecido está o mercado. Quando há uma retração no consumo de bens e serviços,
a geração de resíduos é diretamente impactada.
Cenário econômico
A lógica é simples. Quando um brasileiro vai às compras e
adquire, por exemplo, um aparelho televisor, este vem embalado em um plástico
que, por sua vez, vem dentro de uma caixa de papelão. Toda esta embalagem é
passível de ser reciclada e, portanto, é um potencial combustível para as
engrenagens de empresas como a P & P. Por outro lado, se o país atravessa
uma recessão e as pessoas consomem menos, haverá menos embalagens a serem
descartadas. Não por acaso, Emmanuel ousa apontar o papelão como um termômetro
da economia. “Se você acompanhar os noticiários e algum dia for noticiado que a
área de papelão teve uma retração, pode ter certeza que a economia encolheu.
Este setor onde atuamos é um termômetro”, explica o gerente operacional da P
& P.
Emmanuel explica que, em geral, de agosto a novembro o
volume de resíduos sólidos gerados tende a ser maior. Em dezembro, embalado
pelas festas de fim de ano, o volume atinge o pico. De janeiro a abril
verifica-se uma queda acentuada na geração de resíduos, a qual volta a subir a
partir de maio. Agosto é um mês chave por conceder pistas do quão “animado”
será o segundo semestre no tocante a geração de resíduos sólidos. Ao fim e ao
cabo, a coleta de resíduos sólidos está diretamente relacionada aos níveis de
consumo.
O tempo do contrato firmado entre a P & P e as empresas
parceiras também é variável. Um contrato muito longo pode se tornar uma
armadilha para uma empresa de captação de resíduos sólidos. Pois, ao sabor do
mercado, o volume de recicláveis gerados por uma empresa pode variar ao longo
do tempo para mais e, especialmente, para menos. Se uma crise redundar numa
redução drástica da geração de resíduos sólidos, o material reciclável coletado
não será suficiente para cobrir as despesas da logística reversa. Entretanto,
se a empresa de reciclagem tiver firmado um contrato de um ano, por exemplo,
sem possibilidade de revisão, não haverá outro remédio a não ser absorver os
prejuízos.
Teresa Raquel Barbosa de Lima, 38 anos, participa ativamente
do dia a dia da P & P desde 2006. Atualmente exerce a função de chefe do
departamento pessoal da empresa. Filha de Israel, o fundador da organização,
Teresa admite que, no início, encarava seu labor na P & P como um trabalho
qualquer. Sua concepção mudou depois de uma visita de um consultor do Sebrae.
“Ele mostrou a importância do trabalho da gente, de reciclagem. A partir daí eu
tive mais entusiasmo e satisfação em trabalhar”, lembra.
*Tiago Eloy Zaidan é jornalista e professor da Unidade
Acadêmica de Gestão e Negócios do Instituto Federal da Paraíba – campus João
Pessoa.
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