Anúncios em condomínios garantem logística reversa

Nariberton Lé e Cássio Nogueira, da Paraíba Recicla.

Conheça a estratégia arrojada de empreendedores na Paraíba para coletar resíduos sólidos recicláveis em condomínios enquanto vendem e exibem anúncios.



Tiago Eloy Zaidan*

Nariberton Marcos Pereira Lé, 48 anos, administra uma empresa de telecomunicações e segurança eletrônica em João Pessoa há mais de 25 anos. Ao longo de todo este tempo, tem a rotina marcada por visitas a empresas e condomínios residenciais. Em 2014, justamente durante essas visitas, o empresário – natural de Cajazeiras, no sertão da Paraíba – atentou para a completa falta de atenção dos condomínios com os resíduos recicláveis, descartados misturados com lixo não reciclável. Na ocasião, chegou a sugerir aos síndicos e zeladores a providência da coleta dos resíduos recicláveis com vistas a revertê-los em renda para os próprios condomínios. A sugestão, todavia, foi placidamente ignorada. A partir de então, Nariberton passou a vislumbrar uma oportunidade de negócio.

De olho nos resíduos sólidos gerados principalmente por condomínios residenciais, Nariberton idealizou um sistema sofisticado. Ele próprio se encarrega de providenciar os equipamentos necessários para a separação do lixo dentro dos condomínios e empresas, mediante uma taxa anual. Assim, a segregação dos resíduos é feita na saída do lixo, pelas próprias fontes geradoras. Antecipando-se à mistura indevida do lixo, evita-se a contaminação dos resíduos recicláveis. Separado os recicláveis, Nariberton também se responsabiliza pela coleta destes. Ato contínuo, os resíduos são comercializados, gerando receita para o novo negócio.

O aspecto inovador do sistema, todavia, está na negociação de publicidade institucional, exposta nos equipamentos destinados à coleta seletiva dentro dos condomínios. De modo geral, funciona da seguinte forma: primeiro, fecha-se um pacote com grupos de dez empresas. Essas empresas pagam um valor determinado para terem suas marcas expostas dentro dos condomínios onde estão instalados os equipamentos de coleta seletiva disponibilizados por Nariberton. “As empresas ajudariam nos custos e a gente conseguiria mostrar a imagem delas dentro desse processo de reciclagem”, explica. O viés da publicidade funciona como elemento de capitalização do projeto, cobrindo os custos estruturais, inclusive de logística.

Há pouco mais de 7 meses, Nariberton convenceu o arquiteto e urbanista pernambucano Cássio Costa Nogueira, 38 anos, a embarcar no negócio. Juntos, formalizaram a iniciativa, dando origem à empresa Paraíba Recicla. Desde então, a dupla lançou-se em um périplo para apresentar o projeto a potenciais parceiros. Inicialmente, Nariberton valeu-se dos contatos que possuía nas empresas, em função de seu trabalho na área de telecomunicações.

Modelo de negócio

Cada grupo de dez empresas que fecha parceria com a Paraíba Recicla tem as suas marcas expostas em um grupo de dez condomínios parceiros. “A gente está com um condomínio que tem 96 apartamentos. Temos grupo de condomínios que, juntando tudo, tem 600, 700 apartamentos. Realizamos coleta uma vez por semana, com divulgações e panfletos com as marcas das empresas”, explica Nariberton. Na composição de cada grupo de anunciantes, os sócios tomam o cuidado de não incluir duas empresas concorrentes.

A Paraíba Recicla trabalha com mais de uma modalidade de contrato. Dentre elas, além da opção de publicidade, apenas, a empresa oferece a modalidade de publicidade e coleta. Esta última é uma espécie de combo, onde, além de divulgar a sua marca, o parceiro anunciante tem o seu resíduo reciclável coletado, nos mesmo moldes do serviço oferecido aos condomínios. Ainda é elaborado um manifesto assinado e carimbado, com vistas a comprovar a rastreabilidade dos resíduos gerados pela empresa parceira, documento útil para a geração de um selo verde.

Nariberton e Cássio reconhecem que tocar o empreendimento tem sido um desafio. Especialmente no atual contexto nacional de crise econômica, em que as empresas costumam cortar gastos, especialmente aqueles relacionados à divulgação. Ainda assim, o empreendedor de Cajazeiras não vê a hora de ter condições de abandonar o ramo de telecomunicações e segurança eletrônica para se dedicar exclusivamente ao segmento de reciclagem. “Todo lixo que é descartado tem um valor. Quando você consome uma garrafa com água, você está pagando a água e a embalagem. O que a gente tem que fazer é buscar esse material para gerar renda”.

Gestão sustentável

Empreendimentos como a Paraíba Recicla – que se propõem a captar resíduos sólidos de terceiros – não fazem a reciclagem propriamente dita. Atuam, antes, como intermediadoras, colocando-se entre os geradores dos resíduos sólidos e as indústrias as quais reciclam os resíduos e os fazem retornar ao mercado. Tratam-se, portanto, de organizações que atuam na área de serviços, e que compõem um elo fundamental dentro dos esforços para se encetar a chamada logística reversa.

Além de integrarem um setor econômico importante, que gera empregos e também paga impostos, tais empresas contribuem com o meio ambiente ao encorparem os esforços em propugnação da reciclagem. O reaproveitamento dos resíduos, além de reduzir o volume dos lixões e aterros sanitários, contribui com a economia de energia e água. Em artigo publicado no livro Economia do Meio Ambiente (organizado por Peter May e publicado pela editora Campus), a professora da Universidade Federal do Pará, Maria Amélia Enríquez faz saber, por exemplo, que “na reciclagem do vidro é possível economizar, aproximadamente, 70 % de energia incorporada ao produto original e 50% de água”.

Cientes da missão atrelada ao negócio de suas empresas, os próprios sócios da Paraíba Recicla, quando convidados, participam de eventos educativos em escolas com vistas a conscientizar e estimular estudantes e professores a abraçarem a causa da coleta seletiva.

Do Ponto de vista do marketing, o professor de Administração do IFPB João Pessoa, Felipe Flávio Bezerra Rocha, lembra que as pessoas preferem comprar produtos de empresas que respeitam o meio ambiente. “Nós dizemos na área de marketing que existem negócios ganha-perde, perde-perde e ganha-ganha. Esse é o tipo de negócio ganha-ganha. Ganha o cedente, que está mandando os seus resíduos sólidos para o lugar adequado; ganha a empresa, que está fazendo essa logística, e ganham as empresas cujas imagens estão envolvidas, por se apresentarem como empreendimentos que possuem uma visão racional do resíduo sólido”, explica Rocha.

*Tiago Eloy Zaidan é jornalista e professor da Unidade Acadêmica de Gestão e Negócios do Instituto Federal da Paraíba – campus João Pessoa.

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