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O deslocamento de um indivíduo a um shopping significa mais do que um passo para a efetivação de uma das atividades basilares em uma economia de mercado. O ato de consumir está intimamente ligado – em alguns consumidores de forma mais latente que em outros – ao arrefecimento de angústias, ansiedades, carências e desejos. Ato contínuo, o consumo também é parte fundamental na composição de status e das identidades individuais – embora, paradoxalmente, o consumo de massa penda para a homogeneização dos estilos.
Eloy Zaidan
O que consumimos faz parte de nossa performance, e a loja do shopping, em certa medida, é uma extensão de nosso camarim. Em locais de consumo, como butiques e magazines, forjamos, ou simplesmente reforçamos, nossa identidade visual. Depois disso, devidamente “maquiados”, estamos prontos para entrar no palco: o nosso mundo.
Na medida em que nós nos afastamos – ao menos em tese – da homogeneização, com o ato de consumir, acabamos nos identificando com subgrupos. Seus integrantes demonstram, em ao menos um dos aspectos que levam ao consumo (ansiedade, desejo, etc.), uma semelhança compartilhada.
Mídia
As decisões de consumo na sociedade não são formadas autonomamente. A mídia contribui com a atividade do consumo na proporção em que, por meio de sua programação ou de seus comerciais publicitários, ensina o que consumir.
Um exemplo notório pode ser observado entre o público infantil. Bastam algumas semanas de exibição de um novo personagem de animação em uma rede de televisão eficiente em termos de audiência para que produtos licenciados da criatura protagonista sejam requisitados por inúmeros consumidores mirins.
A exposição seguida da comercialização vem sendo bastante adotada por influentes emissoras infanto-juvenis que transmitem via cabo, como a norte-americana Cartoon Network. E as crianças não são as únicas a “aprenderem” com a mídia. As novelas, permeadas por merchandising, são apenas um dos exemplos mais corriqueiros de apelo ao consumo direcionado aos adultos.
Na medida em que preenche lacunas materiais e emocionais dos indivíduos, trabalhando com o fetiche, a fantasia e, eventualmente, com a necessidade prática dos consumidores, o consumo cumpre o seu dever econômico de sustentar o modo de produção capitalista e a sua constante crise de excesso de produção. O elixir para o mercado é o ciclo virtuoso (ou seria vicioso?) de produção e consumo frenético, a despeito do esgotamento dos recursos naturais do planeta.
A desesperada necessidade de um consumo permanente nos faz constatar mais um paradoxo. Embora o consumo seja efetivado e, até certo ponto, incentivado, como forma de satisfazer ausências físico-emocionais, por outro lado – por meio de propagandas e outras formas de manipulação de mensagens e imagens – o mesmo consumo é sustentado, continuamente, com base em satisfações nunca perfeitamente atendidas.
Contribui ainda para a manutenção de uma permanente e ludibriante ação de consumo, a transformação do gasto em hábito, devidamente regulado por datas comemorativas e estações típicas. Nem mesmo as datas de cunho religioso escapam, sendo antes desvirtuadas a ponto de terem substituídas as essências de suas comemorações.
O Natal cristão provavelmente seja o exemplo mais arrebatador. Aqui, o nascimento do patriarca da filosofia religiosa cede lugar à fartura e as cores vivas dos presentes a serem trocados. E o consumo não se restringe ao dia 25 de dezembro, pois é incentivado não só para o durante como também para o antes e o depois: diz-se que comprar após o Natal é pertinente, pois os preços caem; da mesma forma antes, porque o movimento nas lojas ainda não aumentou.
Os rituais do mundo ocidental (e de um oriente cada vez mais ocidentalizado) são estruturados e gradativamente mais resumidos ao consumo. Seja na ocasião de se fartar em uma ceia de ação de graças ou de se abster de carne na Semana Santa, esbaldando-se, entretanto, de vinho, frutos do mar e ovos de chocolate.
O mercado exige o consumo frequente e massificado. Regulando o calendário e pavimentando modismos, os produtos tornam-se rapidamente perecíveis e passíveis de serem descartados. Novas lacunas são abertas e novos produtos são consumidos. A acachapante experiência do consumo desmedido e a sua sólida estrutura fantasiosa não seriam possíveis sem a participação persuasiva e intensa da mídia.
Tudo é consumível e consumido. Automóveis, feriados religiosos e modas de estação. Conforme frisa o pensador britânico Roger Silverstone, em seu recomendado Por que estudar a Mídia?, consumimos a mídia – com todo o seu aparato de novelas, filmes, telejornais, desenhos animados, etc. – na medida em que somos consumidos por ela.
Leitura recomendada: SILVERTONE, Roger. Por que estudar a mídia?
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