Energia fotovoltaica, tão abundante quanto a luz do Sol


Células fotovoltaicas em cobertura de estacionamento 
A tecnologia fotovoltaica seduz não apenas por conta do apelo ambiental. A possibilidade de produzir energia na própria unidade de consumo, através de painéis em telhados e coberturas de estacionamento, sugere uma quebra de paradigmas ao propor a descentralização da geração.


Tiago Eloy Zaidan*

De uma forma ou de outra, já é cada vez mais comum visualizar pequenos sistemas fotovoltaicos sobre telhados e coberturas de estacionamento, por exemplo, produzindo energia nas próprias unidades consumidoras. Na grande maioria dos casos, especialmente nas cidades, tais sistemas estão conectados à rede de distribuição de energia. Ocorre que, as unidades consumidoras, além de produzirem parte da própria energia que consomem, podem ainda verter o excedente da produção para a rede de distribuição. Em terras brasileiras, esta modalidade de geração foi regulamentada pela primeira vez através da resolução normativa nº 482, de 2012, da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL).

A resolução da ANEEL é considerada um marco por introduzir no país o sistema de compensação de energia elétrica e abrir caminho para uma ruptura de paradigmas no setor, conforme explica o professor de Fontes Alternativas de Energia do campus João Pessoa do Instituto Federal da Paraíba (IFPB), Walmeran José Trindade Júnior. “Até hoje, o que se tem é o modelo das grandes centrais, como as hidroelétricas, as quais geralmente ficam longe dos centros de consumo. Elas exigem extensas linhas de transmissão. E, além disso, dentro das cidades, uma extensa rede de distribuição para essa energia chegar às casas. Com essa resolução nº 482, abriu-se a oportunidade de outro modelo, o da geração no lugar do consumo”, explica o docente.

Notadamente as universidades e os centros de pesquisa foram responsáveis por alguns dos projetos pilotos na produção de energia fotovoltaica conectada à rede, ainda no final da década de 1990. Desde então, a tecnologia tem se espalhado na academia – e fora dela. Em agosto de 2017, por exemplo, o campus João Pessoa do IFPB inaugurou o seu sistema. Após estudo de eficiência, foram instalados painéis fotovoltaicos na cobertura de três blocos do campus e no estacionamento. Foi assim que a instituição centenária – o IFPB nasceu em 1909, durante o governo do presidente Nilo Peçanha, com o nome de Escola de Aprendizes e Artífices – acabou assumindo o posto de uma das maiores produtoras de energia fotovoltaica da capital paraibana.

E expectativa inicial é que em 12 anos a economia propiciada pela energia fotovoltaica cubra os investimentos feitos pelo IFPB João Pessoa na implantação do sistema. Trata-se de uma estimativa conservadora. Como a geração de energia através das células tem superado as previsões, é provável que os custos sejam recuperados antes. Considerando que a vida útil dos painéis fotovoltaicos é de 25 anos, a instituição terá bastante tempo para colher soldos.

Com o novo sistema, além de economizar ao consumir menos energia proveniente da rede de distribuição convencional, o campus ainda pode obter compensações na conta, conforme explica a técnica em eletrotécnica do IFPB João Pessoa, Karolina Lucena de Castro. “Em um dado momento, se a instituição não consumir a energia que produz, ela vai ser lançada na rede, o que geralmente acontece nos finais de semana e em período de férias, quando a nossa demanda é menor. Essa energia que é exportada é abatida da conta de luz”.

Apesar da saliência das vantagens econômicas, especialmente em tempos de bandeiras tarifárias, a adesão da academia à tecnologia fotovoltaica não tem sido motivada apenas pela redução na conta de energia. Ao apostar na alternativa solar, instituições de ensino e pesquisa cumprem papéis de vanguarda e contribuem para ampliar a escala, o que é consonante com a popularização do acesso a uma tecnologia relativamente recente.

O Brasil é pródigo quando o assunto é potencial energético fotovoltaico, graças à sua localização no globo terrestre, a qual favorece a incidência vertical dos raios solares. A isso se soma o fato de que o país está menos sujeito à variação de incidência solar ao longo do ano, por estar próximo à linha do equador. Vale lembrar que a Alemanha se notabilizou nos anos 1990, pela exploração de energia fotovoltaica, mesmo sem todos esses atributos.

Apesar de hoje o sistema conectado (on-grid) ser predominante, ainda há sistemas isolados (off-grid), no qual a eletricidade gerada a partir dos painéis fotovoltaicos é armazenada em baterias. Nesses casos, não há possibilidade de se verter o excedente de energia gerada para a rede. Os sistemas off-grid costumam ser mais caros, principalmente por conta dos custos da bateria. Ainda assim, a depender do contexto, os sistemas isolados são viáveis, especialmente diante da demanda de locais remotos, onde “os altos custos de expansão das linhas de transmissão e distribuição ou as restrições ambientais encarecem e dificultam significativamente a eletricidade proveniente da rede elétrica”, esclarecem os físicos Roberto Ziles e Ricardo Benedito, em artigo publicado na coletânea Energias Renováveis, organizado por José Goldemberg e Francisco Paletta.

Ainda segundo Ziles e Benedito, de 1999 a 2008, a produção de módulos fotovoltaicos cresceu em média 51% ao ano. Somente entre 2007 e 2008, a taxa de crescimento foi de 82%. Somado ao desenvolvimento tecnológico na área, o aumento da produção tem contribuído para uma queda significativa nos custos dos sistemas fotovoltaicos, ampliando as vantagens econômicas.

Embora os aspectos econômicos relacionados à energia fotovoltaica sejam sedutores, é na questão ambiental que reside o seu maior apelo. Walmeran Trindade Júnior lembra que se o chamado custo ambiental fosse agregado ao valor das diferentes fontes de energia, as conveniências econômicas das alternativas renováveis, como a fotovoltaica, seriam ainda mais proeminentes, especialmente se relativizadas com fontes tradicionais como o carvão e o petróleo. Ao contrário dos combustíveis fósseis, a operação dos módulos fotovoltaicos não contribui com o efeito estufa – grande vilão das mudanças climáticas.

E quanto à energia gasta na fabricação dos módulos fotovoltaicos? “Em geral, o período de geração de eletricidade necessário para compensar o gasto energético em sua fabricação, conhecido como payback energético, é de cerca de três anos”, esclarece o documento Energia Renovável: hidráulica, biomassa, eólica, solar, oceânica, publicado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), entidade ligada ao Ministério das Minas e Energia do governo brasileiro.

Ziles e Benedito, no entanto, alertam para o fato de que “a indústria fotovoltaica utiliza gases tóxicos e explosivos e líquidos corrosivos na sua linha de produção”, ainda que a quantidade de tais materiais dependa do tipo de célula que se está fabricando. Outro ponto que merece atenção, embora não raro passe desapercebido, é o que fazer com o descarte depois de alcançada a vida útil dos módulos. Segundo reconhece o documento confeccionado pela EPE, “as tecnologias para o reuso de células de silício resultantes de perdas no processo produtivo ou do fim da vida útil dos módulos, ainda não estão disponíveis em larga escala”.

Walmeran Trindade Júnior comenta que países vanguardistas, os quais utilizam a tecnologia fotovoltaica há mais tempo, já estão enfrentando esse dilema. Apesar defender a possibilidade do reaproveitamento dos materiais das células descartadas, o professor do IFPB reconhece que não é fácil desmontar um módulo. Dessa forma, a questão da reciclagem das células representa, provavelmente, o desafio da vez a ser superado no contexto do desenvolvimento da energia fotovoltaica.

Tiago Eloy Zaidan é jornalista e professor da Unidade Acadêmica de Gestão e Negócios do Instituto Federal da Paraíba – campus João Pessoa.

TOLMASQUIM, Mauricio (Coord.). Energia renovável: hidráulica, biomassa, eólica, solar, oceânica. EPE: Rio de Janeiro, 2016.

VALLÊRA, António & BRITO, Miguel. Meio século de história fotovoltaica. Gazeta de Física,Lisboa, Vol. 29, Fasc. 1-2, Págs. 10 – 15, 2006.

ZILES, Roberto & BENEDITO, Ricardo. Panorama das aplicações da energia solar fotovoltaica. In: GOLDEMBERG, José & PALLETA, Francisco (Org.). Energias renováveis. São Paulo: Blucher, 2012. Págs. 33 – 42.

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